Existem, na Argentina, mais coisas entre o tango e a milonga do que sonha nossa vã filosofia. Dentro de uma cena artístico-cultural variada e bastante rica, o rock progressivo argentino aparece com criatividade e vigor, embora não seja tão difundido como os equivalentes europeus, especialmente o prog britânico.
Assim, o objetivo deste post é listar três discos de três bandas diferentes do progressivo made in Argentina. Obviamente não tenho o propósito de encerrar a discussão limitando-a a apenas três bandas; ao fim da lista, haverá um vídeo de referência publicado no canal Som de Peso, comandado por Bruno Ascari, que traz outros nomes do gênero e do referido país. Vamos lá?
1. Crucis, Crucis (1976)
Lançado em 1976, talvez o disco autointitulado do grupo argentino Crucis seja o mais rock and roll desta lista, já que, dentro da proposta musical do álbum, há forte presença de bons riffs e solos de guitarra característicos do hard rock setentista; a penúltima faixa, “Determinados espejos”, deixa isso bem evidente.

Além dessa potência roqueira, Crucis traz um ótimo uso de sintetizadores, teclados e mellotron, o que caracteriza diversas bandas de rock progressivo ao redor do globo. Das sete faixas, duas são instrumentais: “Determinados espejos” e “Recluso artista”, as duas últimas do disco; estas são as mais longas do álbum, com 6:54 e 6:45, respectivamente.
Outro traço progressivo que se nota no disco são as passagens e os trechos instrumentais complexos, basicamente em todas as faixas, mas especialmente nas duas últimas. Uma obra indispensável para quem quer ampliar os horizontes sonoros do gênero.
2. La maquina de hacer pájaros, La maquina de hacer pájaros (1976)
Um dos mais notáveis nomes do rock argentino, o La maquina de hacer pájaros surgiu da cisão de um outro grupo: o Sui Generis, que encerrou suas atividades em 1975 para voltar em 1992. Formada por Oscar Moro (bateria), Gustavo Bazterrica (violões, guitarras e vocais), Carlos Cutaia (teclados, órgão e mellotron), José Luis Fernandez (baixo elétrico, baixo acústico e guitarra) e Charly García (teclados, pianos, sintetizadores e voz principal), o La maquina lançou apenas dois álbuns de estúdio: o autointitulado, lançado em 1976, e Películas, de 1977.

Charly García era membro dissidente do Sui Generis, grupo cuja sonoridade se aproximava do folk rock e do country. Essas influências se fazem notar no primeiro disco do La maquina de hacer pájaros, conforme se pode ouvir em faixas como “Por probar el vino y el agua salada”, acompanhada por um sintetizador que emula o timbre de uma rabeca, instrumento semelhante a um violino e muito comum no bluegrass norte-americano; além disso, a divisão vocal lembra bastante as canções de Crosby, Stills, Nash & Young, supergrupo americano que se popularizou ao final dos anos 1960.
Outra música que se destaca é “Boletos, pases e abones”, que mais se aproxima da soul/black music e do funk do que propriamente do progressivo, o que ilustra a criatividade e a qualidade do grupo no disco; nesta faixa, são usados o Fender Rhodes e o clavinet, instrumentos de teclas muito utilizados por artistas como Stevie Wonder.
Pinta tu aldea, Alas (1983)
Quiçá este seja o mais brilhante (e o mais argentino) dos três discos mencionados nesta postagem. Pinta tu aldea é o segundo álbum de estúdio do power trio Alas, cujo debut foi lançado em 1977. O disco é todo instrumental e mistura influências bastante variadas, indo do rock ao tango e ao jazz-fusion de grupos como Chick Corea Elektric Band. Embora tenha sido lançado em 1983, Pinta tu aldea foi gravado em 1977.

As influências do tango se fazem perceber na faixa-título, em que é usado o bandoneon, instrumento muito similar ao acordeon na forma e na sonoridade. Nessa mesma faixa, notam-se passagens e temas de jazz, com uso de trompete.
O progressivo aparece em todas as músicas, tendo em vista que as quatro faixas que compõem Pinta tu aldea são bastante complexas e com variações de andamento e compassos, características do gênero. O Alas é formado por Gustavo Moretto (teclados), Carlos Riganti (bateria) e Pedro Aznar (sintetizadores e baixo).
Confira, a seguir, o vídeo de Bruno Ascari em que são recomendados outros álbuns do rock progressivo argentino.