“São Paulo – Brasil”: um tributo à Terra da Garoa e à boa música brasileira

Pesquisar a história da música brasileira, popular ou não, implica quase sempre perceber um nome fundamental nos créditos dos discos: César Camargo Mariano. Fundamental porque o músico paulista aparece creditado como compositor, diretor, arranjador, entre outras funções.

São Paulo – Brasil, de 1977, é um álbum fruto de um período bastante criativo da música brasileira, sucessor da primeira escola de jazz tipicamente nacional, cujo legado são obras como Reencontro com o Sambalanço Trio, segundo disco do Sambalanço Trio; e Jobim, em que o saxofonista Victor Assis Brasil interpreta, ao lado de uma banda impecável, canções de Antônio Carlos Jobim em um approach jazzístico; álbuns brilhantes. Vale dizer que o Sambalanço Trio é um grupo quase dissidente da primeira formação do Octeto de César Camargo Mariano, do qual surgiu um trio formado por Airto Moreira (bateria e percussão), Humberto Clayber (baixo) e César Mariano (piano).

Embora seja tentador falar de modo mais abrangente do jazz brasileiro, aqui nos deteremos a apresentar São Paulo – Brasil. O álbum, que é instrumental em sua íntegra, traz faixas cujos nomes fazem referência à cidade de São Paulo; a primeira, “Metrópole”, já aguça a curiosidade do ouvinte; trata-se de uma música com características do funk norte-americano, como o groove cativante, e do jazz-fusion, o que se evidencia no uso de sintetizadores e do Fender Rhodes, além da ambientação harmônica complexa e pouco previsível.

A forte presença dos ritmos brasileiros pode ser verificada na faixa que encerra o disco, “Futebol de bar”, em que a marcação dos tempos da música é feita quase integralmente pelo piano; um evidente traço da música brasileira, a exemplo do que ocorre em algumas bossas nas quais o ritmo é ditado pela mão direita do violonista, suprindo muitas vezes a ausência de instrumentos percussivos. Na referida música, bateria e demais instrumentos entram apenas no apagar das luzes.

Em “Fábrica”, um recurso bem interessante é usado; como uma espécie de emulação sonora de apitos que ressoavam nas indústrias, usa-se um apito que ajuda a compor ritmo, (contra)tempo e andamento da música. Esse elemento denota criatividade, além de referenciar um dos aspectos do desenvolvimento da capital paulista a partir do século XX: a instalação de fábricas no estado.

A ideia da postagem não é descrever São Paulo – Brasil faixa a faixa, mas dar uma pequena e simples noção do que o ouvinte pode esperar ao escutá-lo. Trata-se de uma obra criativa e basilar do movimento jazzístico que ocorreu no Brasil a partir dos anos 1960, tendo César Camargo Mariano como um dos principais compositores e idealizadores, já que outros discos do gênero foram produzidos sob sua tutela. Outro objetivo é apresentar ao leitor/ouvinte as ricas possibilidades musicais que efervesceram num Brasil que parece ter sabido valorizar apenas uma parte de seus artistas, especialmente os da MPB.

Boa audição!

Faixas de São Paulo – Brasil:

1. Metrópole

2. Estação do Norte

3. Fábrica

4. Poluição

5. Imigrantes

6. Metrô

7. Litoral

8. Futebol de bar

Um gênio à semimargem da Tropicália

É impossível pensar no anos 60 sem que nos lembremos da efervescência política e cultural que marcou o Brasil nesse período. Com a ditadura militar, uma das formas de combater ideais retrógrados e limitantes era o investimento (não necessariamente financeiro) em cultura, isto é, cinema, música, teatro, entre outros.

A Tropicália foi resultado concreto da abertura popular e cultural ao que se produzia no estrangeiro, processo iniciado com o Modernismo quarenta anos antes. Tropicalia ou panis et circenses foi a síntese do que os artistas desse movimento produziram na época. O disco, lançado em 1968, reúne traços da música popular e regional, da música erudita e do rock britânico emergente; vale lembrar que, um ano antes, Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band era concebido, o que tornou ainda mais conhecidos os Garotos de Liverpool, como eram chamados os Beatles, revolucionou a forma de pensar o rock a partir de então e serviu de influência direta não só para a Tropicália, mas para as bandas de rock que surgiam naquele momento.

Tropicalia

Disponível em: https://www.discogs.com/

Ao olhar a capa de Tropicalia, é fácil reconhecer alguns rostos: logo em primeiro plano está Gilberto Gil; atrás, segurando um porta-retratos, Caetano; mais atrás, Rita Lee e os Mutantes. É possível que as pessoas nunca tenham se perguntado quem é o homem à esquerda, sentado de pernas cruzadas e segurando uma xícara que parece não caber em suas mãos. O mais interessante é que, a despeito de quase sempre passar batido, a referida figura foi fundamental para a música brasileira, especialmente na década de 1960. Trata-se de Rogério Duprat, arranjador, compositor e violoncelista formado em Música pela Villa-Lobos.

A música brasileira deve muito a Duprat, tanto quanto deve aos outros artistas do movimento tropicalista. Em termos técnicos, ele talvez tenha sido o sucessor de Villa-
-Lobos no que diz respeito a atar o erudito ao popular, criando uma sonoridade até então pouco ou nada experimentada pelos artistas brasileiros, que ainda tentavam se desvencilhar da bossa nova surgida anos antes. Duprat foi fundamental para Tropicalia, pois foi ele quem elaborou os arranjos e orquestrações de todas as faixas. “Coração materno” soa maravilhosamente bela mais por seus arranjos pensados para cordas do que pela voz insossa de Caetano Veloso, intérprete da canção.

Mas o trabalho de Rogério Duprat não fica restrito ao disco em questão. Ainda em 1968, em parceria com os Mutantes e outros artistas, veio ao mundo A banda tropicalista do Duprat, mais uma obra prolífica e vanguardista, com orquestrações, arranjos de metais, pitadas de rock inglês, baião, chorinho, frevo, bossa nova e MPB. O disco é de uma riqueza musical de impressionar, mas possivelmente o país ainda devia estar tão balançado com os artistas da Tropicália que o deixaram de lado. Vale lembrar que, no
III Festival de Música da TV Record, de 1967, Rogério Duprat foi vencedor na categoria melhor arranjo, para a canção “Domingo no parque”, interpretada por Gilberto Gil à época.

Duprat

Disponível em: https://www.discogs.com/

Em 1971, Duprat participou como arranjador no disco Jardim elétrico, dos Mutantes, bem como teve participação em outras obras posteriores. Seu legado está, conforme diz o Manifesto Música Nova, de 1963, no “compromisso total com o mundo contemporâneo”. Reafirmo: a música brasileira deve demais a muitos gênios que ficaram nos bastidores, e nosso trabalho será sempre de fazê-los conhecidos por seu rico trabalho artístico.

 

Lucy Alves na Série Convidados, da Orquestra Petrobras Sinfônica

Em 9 de setembro, às 20h, o Vivo Rio vai receber o espetáculo “Série Convidados – Petrobras Sinfônica & Lucy Alves”, com regência do maestro Isaac Karabtchevsky. A ideia desse evento é aliar o erudito ao popular, a fim de aproximar o público da cultura musical brasileira, especialmente a nordestina. Lucy Alves foi finalista do The Voice Brasil 2013, mostrando muita personalidade e um talento inegável. Sanfoneira de mão cheia, Lucy, além de cantora, é atriz, com participação em novelas de rede nacional.

OPS

Disponível em: http://petrobrasinfonica.com.br.

Os ingressos para o espetáculo estão disponíveis no site do Vivo Rio, e os preços variam de R$ 80,00 a R$ 160,00. O Vivo Rio fica na Avenida Infante Dom Henrique, 85 – Parque do Flamengo. Para maiores informações, entre no site do Vivo Rio ou na página da casa do Facebook.

“Egberto 70”, no CCBB

O multi-instrumentista Egberto Gismonti vai comemorar os seus 70 anos da melhor forma possível. O Centro Cultural Banco do Brasil está recebendo, de hoje (17/08) até 19/08, o show “Egberto 70”, que conta com participação de nomes como Yamandú Costa, Jaques Molerenbaum, e Gaia Wilmer Big Band. No último dia de apresentação, o próprio Gismonti tocará na casa, o que é garantia de um espetáculo.

Segundo a página do Facebook do CCBB RJ, os ingressos on-line já estão esgotados, mas é possível adquiri-los na casa a cada dia de show. Portanto, caso ainda haja esperança de assisti-lo, chegue cedo, pois é provável que os ingressos para cada apresentação se esgotem rápido. A inteira custa R$ 30,00, e a meia, R$ 15,00. Garantia de shows únicos.

O CCBB fica na Rua Primeiro de Março, 66, Rio de Janeiro, e as apresentações estão marcadas para terem início às 19h.